sexta-feira, 16 de outubro de 2009

À Flora

O príncipe aprende com a raposa que ele é rico de uma rosa, que o cativou. Então ele vai às demais rosas.

- Vós não sois absolutamente iguais a minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativastes a ninguém. Sois como era a minha raposa. Era uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Ela é agora única no mundo.

E as rosas estavam desapontadas.

- Sois belas, mas vazias, disse ele ainda: Não se pode morrer por vós. Minha rosa, sem dúvida um transeunte qualquer pensaria que se parece convosco. Ela sozinha é, porém mais importante que vós todas, pois foi a ela que eu reguei. Foi a ela que pus sob a redoma. Foi a ela que abriguei com o para vento. Foi dela que eu matei as larvas (exceto duas ou três por causa das borboletas). Foi a ela que eu escutei queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. É a minha rosa.

Conhecida esta verdade, a raposa ensina ao principezinho a maior lição que se aprende quando se cativa um outro ser.

- Adeus, disse ele...

- Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.

O essencial é invisível para os olhos, repetiu o príncipezinho, a fim de se lembrar.

- Foi o tempo que perdeste com a tua rosa que fez tua rosa tão importante.

- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... Repetiu o príncipezinho, a fim de se lembrar.

- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa...

- Eu sou responsável pela minha rosa... Repetiu o príncipezinho, a fim de se lembrar.

Essa é a maneira que eu aprendi que eu também sou rico de uma rosa. Uma rosa não, uma flor. Uma flor não, uma Flora! Que no meu íntimo é rainha de tanta coisa. Que no meu coração vive. Uma Flora que me cativou, e por quem eu serei eternamente responsável...

Parabéns por mais um ano, Flora da família Valls!

Cheers!

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Transliteração densa

Achei que o amor fosse um eco guardado num pote, no alto da prateleira esquecida daquela sala mais longínqua de minha mente. Não havia fuga. Não haviam termos usuais. Era mesmo o amor ali naquele pote. A barganha havia sido descoberta. Mas a lascívia está num pote maior. O que fazer?

Garanto sermos noite por todo os dias. E quando passeia a luz, os outros se escondem. Coração de pedra, é o eco, é o eco. Coração de pedra. É o eco, o eco, o eco, o... eco...

Cheers!

Boyfriend

Acordei ao seu lado, vi no cinzeiro os rastros da noite anterior. Estavam pelo chão papéis, peças de roupa, um violão, copos com a numeração raspada e uma vergonha na cara abandonada, pândega. O calor era insuportável. Olhei para o outro lado e vi uma janela fechada. O corpo pesava, acho que o vinho me escravizava, e nem meu olhos queriam permanecer abertos. Me voltei para o teu lado e vi que teu cabelo era mais claro que eu pensava. Duas covinhas ladeando uma boca pequena e carnuda, uma tez firme. Restos de maquiagem de noite. Meu corpo ousava me desafiar. Eu não podia levantar. Segurei em tuas ancas, aninhei-me no teu colo suado e fechei os olhos...

Uma hora depois nós acordamos. Custo pela noite: 80 reais.

A transa foi boa, se os sintomas persistirem, eu deverei ser consultado.

Cheers!

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Viva!

Viva pela droga que consome teu dinheiro, pela marca que a prostituta deixou no seu pescoço, pelo roubo dos seus sonhos, a troca do útero pelo depósito no banco. Viva pelo abraço do falso amigo, pela viagem da amada, por um trocado dado ao mendigo alcóolatra no sinal de trânsito. Viva pelo o que você sabe, pela última palavra numa discussão, pela virgindade perdida, pela perda, pelo sono.

Não evite perder. Perca sempre que puder. Há perdas melhores que qualquer ganho irreparável. Há ganhos que nunca serão tão bons quanto uma boa perda.
Cheers!