Computando
os dados. Yor estava sentada na calçada em frente a sua casa,
vestindo aquele moletom velho e puído, um sorriso estranho no rosto
que encarava quem passava. Ela esperava o entregador de jornal, ávida
pelas notícias do plantão policial. Amava a tragédia e a
imperfeição com que os crimes eram tão evidentemente elucidados
pela polícia. Apesar disso ela tinha uma queda pelos bandidos, e
muito frequente “torcia” para que algum criminoso em fuga não
fosse capturado ou que um crime sem solução permanecesse sem
solução. Ela guardava as matérias num fichário, a maioria com
notas e até alguns desenhos, e as “mais interessantes” ficavam
num arquivo de três gavetas, organizadas por data, jornal ou nome do
criminoso. Ela nunca organizava por crime. Acreditava que crime é
crime, tanto faz se é um sequestro ou um furto.
A
mãe de Yor, Jezebel, acredita que sua filha será uma importante
investigadora no futuro, e até apoia o hobby da filha. O pai de Yor
é um contador de nome Zacarias. Nunca prestou atenção em como a
filha gastava seu tempo livre, mas já estava até acostumado em ser
o segundo a ler os jornais. Yor possui um irmão, Orven, quatro anos
mais novo que ela, e seu principal ouvinte e companheiro.
Computando
os dados. Yor estava na casa de sua amiga e vizinha Gir, falando de
garotos, e folheando essas revistas adolescentes. Gir estava servindo
de cupido, e havia convidado Leto, um rapaz da sua igreja, para sua
casa. Yor havia pedido o encontro, que não poderia acontecer na sua
casa por conta da pentelhice de Orven e, claro, porque não poderia
ficar a sós com um rapaz em seu quarto. Tudo dependia dos pais de
Gir chegarem no mesmo horário de sempre e não acabarem com o
encontro. Yor estava sem calcinha e vestindo uma camisa de hóquei, e
calculara cada segundo de seu encontro com Leto. As duas combinavam
detalhes quando a campainha soou.
Um
rapaz educado, de fala macia, com grandes olhos castanhos. Leto
trouxe duas pizzas, provavelmente por não saber do encontro às
escuras que Gir promoveu, e por achar que seria somente uma tarde de
lanche e filme. Ficou um pouco desconfortável quando soube que os
pais de Gir não estavam em casa, e mais ainda constrangido quando as
duas o convidaram para subir para o quarto. Inventou uma pequena
tosse e perguntou pelo banheiro. Lá dentro ele manda uma mensagem
para um amigo: “ESTOU NUM QUARTO COM DUAS GAROTAS!! UMA DELAS FEZ
QUESTÃO DE MOSTRAR QUE ESTÁ SEM CALCINHA!!! FODA NÃO TER TRAZIDO
CAMISINHA!!! DEPOIS MANDO FOTOS”. A mensagem foi enviada e
visualizada. Em segundos a resposta: “Para de bater punheta, porra!
Quero foto nenhuma não!”.
Computando
os dados. Yor está no shopping afim de comprar um edredom de
presente para seu irmão. Os preços estão muito elevados. Na sua
mente ela pensa “poderia roubar facilmente pela área de descarga
de produtos”, mas daí ela lembra que em todo lugar existem câmeras
de segurança. Isso a deixa aliviada porque ela se preocupa de não
deixar esses pensamentos criminosos crescerem dentro dela. Mesmo
assim ela tem uma sensação de que pensar assim é algo natural, e
que ela não está sozinha. Então ela escolhe o edredom, leva até o
caixa e efetua o pagamento, vendo ir embora boa parte de sua mesada.
Nada mal, Orven merece.
Na
festa do aniversário de Orven o bolo era no tema de um filme de ação
onde homens falam com carros que se transformam em robôs. Gir e Leto
vieram, e trouxeram presentes. Yor foi bem cerimonial com Leto e
tratou de se isolar em seu quarto, em meio aos seus arquivos. Jezebel
estava radiante num vestido amarelo e seu marido Zacarias era o pai
mais desastrado da face da terra. O pobre pai havia quebrado a
vidraça da janela pondo uma escada afim de colar os balões da
festa, deixado o frango muito além do tempo no forno, deixando a
casa com aquele odor de carne queimada e, sem querer, quebrado um dos
presentes de Orven. Mesmo assim ele ria e contava piadas aleatórias
para os convidados. No final da tarde todos foram embora e sobrara
mais de dois terços do bolo, e muitos salgadinhos. Orven agradeceu.