sábado, 2 de abril de 2016

Rir da fatalidade

Foi divertido chegar naquele lugar úmido e abandonado e ver todos aqueles moleques dançando pelados ao redor de uma fogueira, como se fossem nativos entrando em conexão com a natureza, vocalizando cânticos e palavras ininteligíveis, levando as mãos ao alto como se evocassem deuses ancestrais. Foi realmente divertido ver aquela cena. Um bando de drogados sacaneados por alucinações de uma droga avassaladora. Marionetes infames.

Slash é o nome de uma nova droga. Promovia sensações das mais variadas, alucinógenas e psicodélicas, e a grande maioria das pessoas que experimentavam, se tornavam rapidamente submissos, melhor dizer viciados, a essas sensações. Ouvi relatos de pessoas que experimentavam, inclusive, dependendo da dosagem, a privação de algum sentido, algo que eu jamais ouvi falar por outras drogas. Pessoas que ficavam dias sob efeito da droga, com suas mentes ocupadas, completamente distantes da realidade ao seu redor. Era triste.

Essa droga era vendida nos mais diversos ambientes. Ricos e pobres, nem classe nem gênero, a droga estava dominando o mundo numa escalada jamais vista. O mundo, de repente, se viu tomado por zumbis viciados em Slash. Os governos não estavam preparados, e em poucas semanas após os primeiros registros do uso dessa droga, logo surgiram pesquisas mostrando a sua rápida ascensão, sua distribuição fácil e quase imperceptível. Slash é vendida em ampolas de poucos centímetros, um líquido transparente ou levemente amarelado. Cerca de 5ml da droga era o suficiente pra um dia inteiro de "barato". E o que dizer do preço? Você compra facilmente pelo mesmo preço de um fast food médio!

Mas o que incomoda mesmo os governos e orgãos de saúde pública é a facilidade de produzir o Slash. Obtido a partir de um processo químico cuja matéria prima são um tipo de cogumelo, uma raiz e uma casca de árvore, mesmo alguém com poucos recursos, mas com a matéria prima na quantidade certa, duas panelas, um coador, um fogão e um prato, pode produzir bastante droga, mesmo que numa pureza duvidosa. Já os grandes traficantes, que se viram "perdendo mercado", migraram rapidamente, e produzem drogas com maior pureza e, claro, as ampolas, que saem num ritmo industrial. A última grande apreensão de Slash se deu na Austrália: 220 litros da droga!

É por isso que eu ri quando fui buscar meu sobrinho, no meio do mato, sujo e dançando ao redor de uma fogueira. Ri da fatalidade. Eu ri do caos. Eu ri do sistema. Ele não é uma vítima. Ele só se perdeu da mãe num shopping, uma semana atrás, e só hoje eu descobri onde ele estava. Um garoto de 12 anos, que provavelmente nunca havia experimentado nenhuma droga. Um garoto de 12 anos, pelado, vocalizando como um animal pré-histórico, ao redor de uma fogueira. Eu preciso rir disso. Logo o efeito passa, e ele vai querer mais. Ele vai desejar se perder de sua mãe no shopping outras vezes. E eu vou rir todas as vezes que isso acontecer.

Cheers!