sábado, 28 de novembro de 2015

Uma vida em Mi Menor

Reapresentando este texto, de minha autoria, retirado de outro blog.

Eu achei um tesouro nos teus olhos, mas quem me dera tivesse teu olhar nos meus. Havia tanto a te dizer, um louco apaixonado somente esperando o dia certo, a ocasião. Nada de palavras decoradas, somente uma sinestesia que tomava conta de mim quando te via. Ah, meu coração saltava do peito quando passavas! Eu corria para o portão para te ver, no horário que chegavas do teu trabalho. Eu acreditava que um dia olharias para mim, e o brilho do teus olhos me enfeitiçaria, e em breve serias minha. Sim, eu cria nisso.

Um dia, porém, eu a vi novamente. Anos de espera já haviam me tornado um paciente algo cansado, mas aquele dia eu deixei todas as palavras do passado no seu devido lugar. Eras tão bela naquele vestido branco florido de flores carmim! Eu deixei o que fazia por alguns instantes e te olhei. Notei que as pessoas paravam quando tu passavas, todos te admiravam. Novamente no meu peito queimou a velha chama do passado, como se eu me reaproximasse do calor da paixão que nutria por ti. Ali, naquele momento, o esplendor de tua passagem moveu meus sentimentos e minhas forças na direção do nobre sentimento. Mas eu me enganara!

Os anos haviam secado minha alma ao sol da espera. Mesmo que te via, sei que dentro de mim já havia um domínio da mente, da razão. Uma luta secular que já mostrava um vencedor. E a fugaz manifestação da velha chama foi logo apagada pelos apelos duma mente já cansada de desejar algo tão belo e intocável. "Pobre de mim", era o que eu pensava. Centenas de olhares, tantas e tantas vezes lançados, nenhum correspondido. Era uma falha muito gostosa de cometer, mas deveras dolorosa de repetir. Resolvi seguir a direção do sol, e deixar teu rastro para trás.

Hoje, pensar em você não é frustração. Nem sei mais se consigo lembrar do teu rosto. Passaram-se cinquenta anos, e a minha memória está corroída pelo tempo. Eu não me prendi em novos grilhões, estou sozinho em meio a terras e mais terras, fruto do único amor correspondido que tive na minha vida, o trabalho. Não penso que seria feliz ao teu lado, o que me convence é achar que você teria sido feliz ao meu. Não sei como, mas sei. E é tão grande a vontade de te ver novamente. Do tamanho da minha tristeza. Assim eu olharia, mais uma vez, para a última mulher que eu amei.
 
Cheers!

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